segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

81 anos de voto feminino no Brasil

Em 24 de Fevereiro de 1932 o decreto 21.076 do Código Eleitoral Provisório foi aprovado, assegurando o voto feminino, com algumas restrições (apenas casadas ou viúvas e solteiras que tivessem renda própria), mas fruto de uma luta iniciada ainda no Império. Em 1934 tornou-se facultativo para todas as mulheres e em 46 a obrigatoriedade do voto foi estendida. Contamos em 2013 então 81 anos dessa conquista.

Ainda no Império, com o movimento abolicionista e toda a efervescência política, questionava-se o sufrágio feminino. Com a Proclamação da República e a nova Constituição o debate cresceu, e por fim, não se aprovou, mas também não se proibiu, abrindo brechas para diferentes interpretações. De 1919 a 1928 tramitou o Projeto de Lei do  senador paraense Justo Chermont, que propunha o voto para mulheres maiores de 21 anos. Em 1927 Celina Guimarães Viana se tornou a primeira eleitora do Brasil, em Mossoró, no RN. Em 29, Alzira Soriano de Souza foi eleita a primeira prefeita, em Lages, também no RN, devido as brechas da Constituição Republicana de 1891.

Em 1919 Bertha Lutz voltou ao Brasil recém-graduada da Universidade Sorbonne, e fundou a Liga para a  Emancipação Intelectual da Mulher. O movimento tomou força e em 22, com a participação de Bertha na 1° Conferência Pan-Americana de Mulheres, tornou-se Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, FBPF. A principal reivindicação era o sufrágio feminino, para que a partir daí as mulheres adentrassem espaços tradicionalmente masculinos e pudessem alçar voos mais altos. Como a própria Bertha  colocava que "o sufrágio feminino não é um fim em si mesmo, mas sim um instrumento a ser usado para melhorar a condição das mulheres". 

Em 1932, o sufrágio foi estendido às mulheres no Código Eleitoral Provisório. E  Bertha e Nathércia Silveira foram as representantes na Comissão de Elaboração do Ante-Projeto à Constituição de 1934, a FBPF esteve presente em todo o processo, para garantir que não houvesse retrocesso. Em 1936 Bertha, que era suplente, assumiu o cargo de deputada federal. 

Muitas são as críticas quanto ao comportamento das feministas do começo do século passado, que ao reivindicar apenas o voto e aliar-se a grupos que historicamente as oprimiam, portar-se de maneira moderada e tendo ações que beneficiavam em primeira instância apenas mulheres já privilegiadas, contribuíram para a manutenção do status quo, legitimando uma nova ordem burguesa.

Entretanto, tais argumentos apresentam um anacronismo estupendo. Como coloca Rachel Sohiet "a utilização deste recurso revela uma das táticas próprias a sujeitos submetidos a relações desiguais de poder. As feministas com Bertha Lutz à frente, valeram-se de uma tática que mobilizou para os seus próprios fins uma representação imposta - aceita, mas desviada contra a ordem que a produziu". Elas não estavam mantendo o statos quo, estavam modificando-o, com os instrumentos que possuíam e da maneira mais inteligente possível. Isso é admirável.

Revoluções, subversões totais da ordem, historicamente não terminam bem. Acredito ser um método mais inteligente utilizar-se de reformas. As duas forças que movem o desenvolvimento humano são as de conservação e modificação, apenas o equilíbrio entre as duas possibilita estabilidade e progresso simultaneamente. Por isso reconheço que sem Bertha, Nathércia e todas as mulheres da FBPF e das que apenas apoiavam o movimento na surdina, hoje eu sequer cogitaria falar sobre política. Foram elas que deram os primeiros passos para que pudéssemos reivindicar outras tantas coisas ao longo desse século. Foram elas, dentro de suas possibilidades, que abriram caminho lentamente para que hoje pudéssemos correr nessa estrada.


O voto, na democracia moderna, é o instrumento pelo qual os cidadãos delegam poder de decisão e representatividade aos seus líderes. É nossa moeda de troca (e não tô falando de compra de votos, por favor, né), por ele temos como pressionar os políticos para que nossas pautas sejam ouvidas e reivindicadas. Sem o voto feminino questões relativas às mulheres nunca teriam chegado ao centro das discussões e se tornado importantes no desenvolvimento do país. Sem o voto as mulheres nunca teriam adentrado esse espaço tradicionalmente masculino, desbravando preconceitos e quebrando tabus. Sem ele, ainda estaríamos sob tutela de nossos pais, irmãos e maridos. Por isso, um muito obrigada a essas mulheres que há mais de 81 anos atrás lutaram por um direito tão básico ao cidadão moderno. Um muito obrigada.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SOIHET, Rachel. Bertha Lutz e a Ascensão Social da Mulher. Niterói: Mestrado em História. Departamento de História. ICHF, UFF

5 comentários:

  1. Aiai Nands... Nossas divergências políticas...
    "Revoluções, subversões totais da ordem, historicamente não terminam bem."
    O que é "não terminar bem"?
    A Revolução Francesa terminou mal para a burguesia francesa? A Revolução Industrial terminou mal para o Capitalismo? Ou vivemos em um mundo capitalista através de reformas progressivas e lentas, em que a surgida burguesia foi comprando títulos nobres e, um dia, tornou-se absoluta sobre a nobreza de sangue e aboliu a nobreza e todo mundo concordou e achou ótimo?

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    1. Não terminam bem porque no fim das contas sempre uma ordem volta a vigorar e aqueles que mais precisam da mudança geralmente só passam a servir a outro senhor. Como eu disse, acho mais inteligente reformas graduais e que sejam efetivas.
      A revolução industrial pode se dizer que foi gradativa, a francesa teve seus momentos de caos e depois veio o Napoleão reinstaurar a ordem e legitimar novos privilegiados.
      A estabilidade política permite ações a longo prazo e até a curto prazo que sejam mais confiáveis, e com uma "revolução" a estabilidade é zero.
      Eu fico com o meio termo entre manter e mudar, a terceira margem do rio me parece a mais segura.

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    2. E esse trecho foi super cortado, hahah tentei não provocar, era bem maior e ia dar pano pra você criticar horrores. Mas eu já tenho levado porrada demais, então tentei só defender as sufragistas e ponto.

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    3. Eu gostei MUITO do seu texto. Como texto e como informação. Acho que a luta contra-hegemônica é essencial, mas deve ser APENAS um meio e nunca um fim.
      Minha crítica ao trechinho foi apenas porque achei que era contraditório com as suas próprias posições políticas. O próprio capitalismo foi instituído na base de muita revolta e porrada, não reforma. (As reformas costumam ser consequência de revoltas e porradas. Assim como muitas sufragettes tiveram de se suicidar publicamente para que o movimento ganhasse qualquer expressividade na mídia do século XIX)

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    4. Mas eu não sou o capitalismo.
      O fato de eu me alinhar a muitas ideias liberais não me encarcera nisso. Cada questão traz uma reflexão diferente, influenciada por n fatores e meu posicionamento pode não ser "coerente" com os outros.
      Se o capitalismo até agora foi instituído com base na revolta, eu acredito que para mantê-lo o melhor são as reformas, é um bicho que se refaz, ele engole as críticas e se reconstrói, nem sempre dá certo, mas é o sistema das idas e vindas, crises e altas.

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