sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Mãe, mulher, detenta


            Numa análise até das mais rasas do sistema carcerário brasileiro, é nítida a situação degradante de desrespeito aos direitos humanos referentes à precariedade das condições físicas oferecidas nas cadeias e presídios, ao déficit de vagas, à absoluta insalubridade nas unidades de aprisionamento, comumente caracterizadas como “depósitos de seres humanos”. As desigualdades existentes no país refletem-se no sistema penitenciário, e o problema se agrava para a mulher detida no Brasil. Nas condições descritas a seguir, sofre violações decorrentes das características inerentes à qualidade de pessoa do sexo feminino, quais sejam violência física, sexual e sofrimento psicológico.
            De acordo com estudo realizado pelas advogadas Nadir Cardozo e Maria Lazarini, "milhares de mulheres têm cumprido pena em delegacias de polícia e cadeia por falta de penitenciárias, sujeitas à superlotação, condições de higiene precária e não adaptadas às condições femininas". Somam-se a isso os inúmeros casos de mulheres presas junto com homens em delegacias, e as mulheres grávidas que reclamam das más condições do sistema carcerário, no período da gestação e depois do parto.
            Apesar de compor uma pequena parte da totalidade dos detentos, também deve-se lembrar que a oferta de vagas para mulheres no sistema prisional é muito baixa. No caso do encarceramento feminino, há uma histórica omissão dos poderes públicos, manifesta na completa ausência de quaisquer políticas públicas que considerem a mulher encarcerada como sujeito de direitos inerentes à sua condição de pessoa humana e, muito particularmente, às suas especificidades advindas das questões de gênero.
            Percebe-se a necessidade de um sistema penitenciário pensado para as mulheres e não, mera cópia de políticas e presídios voltados para os homens. Devem-se levar em conta suas responsabilidades sociais e domésticas, tal qual o convívio com os filhos, a gravidez, seu acompanhamento, bem como o contato com o recém-nascido. 
            Um grande problema para as mulheres presas é a preocupação com a situação econômica da família e a distância dos filhos. Segundo um estudo da Associação dos Juízes para a Democracia, a violência contra a mulher presa repercute em sua família. São apontados alguns fatores como a restrição dos horários de visitação, raro acesso a telefones públicos, estigmatização social e, no que concerne à maternidade, falta de assistência médica durante a gestação, de acomodações destinadas à amamentação, berçário e creche.
            Em algumas unidades, há a possibilidade de amamentar os bebês por seis meses, sem muita estrutura para isso. As unidades do interior, cadeias públicas na maioria, não permitem e não têm espaço. As parturientes são deslocadas para a capital, o que vem causando sérios problemas, pois bebês já nasceram nas celas por falta de atendimento médico. O Grupo de Estudos e Trabalho "Mulheres Encarceradas" já encaminhou à Defensoria Pública um ofício solicitando a intervenção dos defensores em favor das gestantes, para que possam cumprir a prisão (provisória ou definitiva) em seu domicílio, enquanto durar a amamentação.
            Outro ponto de desigualdade é em relação à visita íntima. No Brasil, a visita íntima às mulheres é vista como benefício e não como direito, enquanto para os homens é um direito garantido de forma plena há anos. Existem poucas penitenciárias femininas que atendem às recomendações legais. Mas, para Márcia Rodrigues Setúbal, diretora da Penitenciária Feminina de Tatuapé/SP, além de se reformar a estrutura física das penitenciárias, os funcionários também precisam receber orientações no sentido de aceitar e respeitar a sexualidade dessas mulheres. Ela também ressalta que, independentemente de normas legais, as presidiárias procuram saciar suas necessidades sexuais: "o fato é que, de forma não consentida pela administração, as presas têm conseguido alguns encontros sexuais furtivos com seus companheiros e não têm se preocupado muito com a adequação das instalações".
            O relatório da AJD alerta ainda para o cumprimento da função do Estado como protagonista da reinserção social dessas mulheres. As pesquisas realizadas demonstraram ainda ser escasso o acesso de mulheres presas a programas educativos, profissionalizantes, de trabalho e de reabilitação nas unidades federativas brasileiras. Além das condições adversas relacionadas à viabilização da escola e das aulas, pesquisas demonstram que, muitas vezes, as mulheres presas atribuem o aparente desinteresse pelas atividades educacionais à falta de condições emocionais, resultantes da situação de tensão interna à instituição prisional e, também, preocupações com a família, em especial com os filhos.
            A Lei de Execuções Penais, ao dispor sobre os direitos – saúde, educação, assistência social, exercício do trabalho e de atividades intelectuais, no caso das mulheres em gestação, reclusão em estabelecimento compatível, direito à amamentação, entre outros (arts. 41, 83 e 89 da LEP) – dispôs  também sobre a obrigação do Estado em oferecer condições materiais à execução desses direitos... mas é mais cômodo e barato pagar um carcereiro para cuidar de um cadeado do que investir nas centrais de atendimento, na capacitação de funcionários e no exercício da cidadania. 
            A desproporcionalidade na aplicação de penas em relação ao crime praticado, quando se impõe regime fechado até para penas inferiores a um ano, ou, ainda, quando se mantém prisões cautelares em decorrência do flagrante sem motivação adequada e por mais tempo do que o previsto, causa temor na sociedade e gera graves distorções e insegurança na população, pois fica muito evidente que há uma justiça para ricos e outra para pobres. Há que se lembrar que a pena prevista para seus crimes  (quando enfim julgados) é de privação da liberdade. Mas em nenhum trecho do texto da Lei fala-se em privação da maternidade, das condições de higiene, da saúde, e, principalmente da dignidade.

2 comentários:

  1. Levantou pontos interessantes Bianca, parabéns.

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  2. Amei seu cantinho tudo lindo adorei mesmo ja seguindo

    vou fica muito felizzzz se retribuir da uma passadinha la meu cantinho

    http://midianmulata.blogspot.com.br/

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